cinza cimentada era
sem motivos de Cecília
branca, vermelha, nem amarela
foram-se rosas e notílias
solitária em algum jardim
ou de plástico sob a mobília
hoje a rosa vive assim
sem os motivos de Cecília
o que conserva e resume
as notícias de um roseiral
não é da flor o perfume
é o ser rosa virtual
e mesmo assim ainda brilha
o olhar de qualquer mortal
com as rosas de Cecília
e as deixadas no portal...
MOTE: a lucidez das rosas...
4º Motivo da Rosa
Cecília Meireles
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim."Os Cinco Motivos da Rosa
Primeiro Motivo da Rosa
Vejo-te em seda e nácar,
e tão de orvalho trêmula,
que penso ver, efêmera,
toda a Beleza em lágrimas
por ser bela e ser frágil.
Meus olhos te ofereço:
espelho para face
que terás, no meu verso,
quando, depois que passes,
jamais ninguém te esqueça.
Então, de seda e nácar,
toda de orvalho trêmula, serás eterna.
E efêmero o rosto meu, nas lágrimas
do teu orvalho... E frágil.
Segundo Motivo da Rosa
(a Mário de Andrade)
Por mais que te celebre, não me escutas,
embora em forma e nácar te assemelhes
à concha soante, à musical orelha
que grava o mar nas íntimas volutas.
Deponho-te em cristal, defronte a espelhos,
sem eco de cisternas ou de grutas...
Ausências e cegueiras absolutas
oferece às vespas e às abelhas.
E a quem te adora, ò surda e silenciosa,
e cega e bela e interminável rosa,
que em tempo e aroma e verso te transmutas!
Sem terra nem estrelas brilhas, presa
a meu sonho, insensível à beleza
que és e não sabes, porque não me escutas...
Terceiro Motivo da Rosa
Se Omar chegasse
esta manhã,
como veria a tua face
Omar Khayyam,
tu, que és de vinho
e de romã,
e, por orvalho e por espinho,
aço de espada e Aldebarã?
Se Omar te visse
esta manhã,
talvez sorvesse com meiguice
teu cheiro de mel e maçã.
Talvez em suas mãos morenas
te tomasse, e disesse apenas:
"É curta a vida, minha irmã".
Mas por onde anda a sombra antiga
do âmago astrônomo do Irã?
Por isso, deixo esta cantiga
- tempo de mim, asa de abelha -
na tua carne eterna e vã,
rosa vermelha!
Para que vivas, porque és linda,
e contigo respire ainda
Omar Khayyam
Quarto Motivo da Rosa
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verá, só de cinzas franzida,
mortas, intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que vão me lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.
Quinto Motivo da Rosa
Antes do teu olhar, não era,
nem será depois, - primavera.
Pois vivemos do que perdura,
não do que fomos. Desse acaso
do que foi visto e amado:- o prazo
do Criador na criatura...
Não sou eu, mas sim o perfume
que em ti me conserva e resume
o resto, que as horas consomem.
Mas não chores, que no meu dia,
há mais sonho e sabedoria
que nos vagos séculos do homem."
Cecília Meireles - Ed. Nova Aguilar
Nenhum comentário:
Postar um comentário